Perguntas e respostas sobre exposição a sangue e outros materiais biológicos

25 de setembro de 2012 - 14:44


Perguntas e respostas sobre exposição a sangue e outros materiais biológicos

Por que a exposição a líquidos biológicos e materiais contaminados preocupa tanto os responsáveis pelo controle de infecções em ambiente hospitalar? 

Profissionais da área da saúde estão comumente expostos a diversos agentes infecciosos, como os vírus das hepatites B (HBV), hepatite C (HCV) e o HIV. Os principais meios de exposição são picadas acidentais de agulhas contaminadas, ferimentos com outros instrumentos contaminados, ou através do contato com os olhos, nariz, boca ou pele de sangue ou outro líquido biológico. 

Acidentes com agulhas ocorrem freqüentemente entre esses profissionais. Cerca de 600.000 picadas de agulha são registradas nos EUA todos os anos. Como esses eventos costumam ser pouco notificados, calcula-se que cerca de mais de 1.000.000 deles não cheguem a ser reconhecidos pelos órgãos controladores norte-americanos todos os anos. Estima-se ainda que 1000 profissionais contraem doenças sérias a cada ano nos EUA como resultado de acidentes com agulhas contaminadas. Cerca de 2% do total de acidentes ocorrem com agulhas contaminadas com o HIV.  

Como posso prevenir acidentes ou pelo menos reduzir o risco de transmissão de doenças caso eles ocorram? 

Todas as pessoas que trabalham em locais que prestam serviço à saúde ou mesmo de cuidados de doentes em domicílio deveriam passar por avaliações periódicas quanto à “status vacinal”, condições gerais de saúde, teste de PPD e sorologias de rotina ( hepatites B e C, HIV, sarampo, caxumba, rubéola etc ). 

O treinamento e a educação profissionais visando reduzir a exposição a agentes infecciosos é elemento indispensável e deve ser exigido dos administradores dos serviços de saúde, bem como dos cursos universitários em áreas correlatas. Conhecimentos sobre modos de transmissão das doenças ocupacionais, seus sintomas, risco de contágio e prevalência na população atendida são um alerta para a importância da prevenção de acidentes em ambiente hospitalar. 

A vacinação para hepatite B está indicada para todo profissional da área da saúde, de preferência antes do início das atividades práticas. 

O CDC, órgão responsável pelo controle e prevenção de doenças infecto-contagiosas nos EUA, publicou uma série de recomendações e precauções conhecidas como “Precauções Universais”. Entre elas estão a seguintes: 

Todo sangue humano e certos líquidos corporais (sêmen, líquidos com sangue visível, secreção vaginal, líquor, líquido sinovial, peritoneal, pleural, pericárdico ou amniótico) são considerados potencialmente infecciosos para hepatites B e C, e infecção pelo HIV;

As precauções geralmente não se aplicam a fezes, leite materno, secreções nasais, catarro, saliva, suor, lágrimas, urina e vômitos, exceto quando contenham sangue visível;

Luvas devem ser usadas quando se entra em contato com líquidos corporais, membranas mucosas, pele não intacta, para manuseio de instrumentos ou superfícies com sangue, ou para a realização de punção venosa ou outros acessos vasculares;

Máscaras e protetores oculares devem ser usados durante procedimentos que provavelmente geram gotas de sangue ou outros líquidos corporais, como punção ou dissecção venosa profunda, aspiração de vias aéreas e entubação traqueal, endoscopias, broncoscopias e procedimentos dentários;

Gorros e aventais devem ser usados em procedimentos com provável ocorrência de “espirros” de sangue, sendo que estes materiais devem ser removidos antes da saída do local de procedimento;

Mãos e outras superfícies cutâneas devem ser lavadas imediatamente se contaminadas com sangue ou outros líquidos biológicos; 

As mãos devem ser lavadas imediatamente após a remoção das luvas, pois não há barreira 100% eficaz;

Agulhas não devem ser reencapadas, dobradas, ou manipuladas propositadamente, ou removidas das seringas; 

Após o uso de agulhas e objetos cortantes, estes devem ser inutilizados imediatamente e coletados em recipientes resistentes, sempre localizados próximos ao local do procedimentos.

Após um contato com material contaminado, quais são meus riscos de adquirir uma doença infecciosa? 

São vários os fatores que determinam o risco de transmissão ocupacional de uma doença. A possibilidade de transmissão geralmente varia de acordo com o número de infectados na população, a chance de infecção após um único contato e o tipo e número de contato ocorridos. 

Felizmente a maioria das exposições não resulta em infecção. O risco de transmissão após um único contato irá depender do patógeno envolvido, do tipo de exposição e gravidade do ferimento, quantidade de sangue no material contaminado e a quantidade de vírus presente no mesmo sangue. 

 
Hepatite B

Indivíduos com imunidade confirmada após vacinação para hepatite B (anti-HbsAg positivos) praticamente não apresentam risco de infecção pelo HBV. Para pessoas não imunes o risco de infecção após uma única exposição através de picada de agulha ou corte percutâneo varia entre 6% e 30 % . 

 
Hepatite C

Não ultrapassa 2% o risco de transmissão do HCV após um único acidente com agulha ou outros objetos cortantes. O simples contato com pele ou mucosas tem um risco ainda menor. 

HIV

Quando há um acidente com objetos corto-perfurantes, o risco médio de infecção pelo HIV é de 0,3%, caso não seja feita a quimioprofilaxia logo em seguida. Pacientes com carga viral alta ou AIDS avançada podem transmitir o vírus com mais freqüência. 

O risco após contato único com olhos, nariz ou boca com sangue infectado é estimado em 0,1%. O contato com lesões de pele e o aumento do tempo de exposição ao material contaminado aumentam o risco de transmissão pelo contato de sangue com a pele. 

Existem cuidados após o acidente que diminuem o risco de transmissão? 

A primeira medida que deve ser tomada após a exposição a qualquer material contaminado é a lavagem exaustiva do local com água e sabão, exceto quando o local de contato for à conjuntiva ocular, que deve ser irrigada intensamente com qualquer solução estéril ou água corrente. 

Em caso de acidente com transfixação percutânea, deve-se deixar sangrar livremente. Não se deve espremer a lesão provocada pelo acidente. Caso a sorologia do paciente seja positiva para qualquer um dos agentes infecciosos (HCV, HBC ou HIV), a pessoa exposta deve manter por 6 meses as precauções para evitar a contaminação de outras pessoas, como não doar sangue, usar preservativos e evitar a gravidez, pois este é o período necessário para confirmação da doença. Amamentação também não é recomendada nesse período. 

Após a exposição, o que se deve fazer se aparecerem os sintomas agudos da infecção? 

As pessoas contaminadas com os vírus da hepatite B ou C podem desenvolver hepatite aguda algumas semanas após o acidente, caracterizado por icterícia de pele e mucosas, perda do apetite, náuseas, vômitos, febre, dores abdominais e cansaço. A infecção aguda pelo HIV pode causar febre, rash cutâneo, dores musculares, cansaço e adenomegalias, ocorrendo geralmente 2 a 4 semanas após o contágio. Mas nem sempre esses sintomas aparecem na pessoa infectada. É importante que qualquer sintoma seja percebido e comunicado rapidamente ao serviço que está acompanhando o caso. 

É grande o número de profissionais infectados nesses acidentes? 

Nos EUA, 800 profissionais de saúde tornam-se infectados pelo HBV todos os anos. Cerca de 1% de todos os profissionais norte-americanos que trabalham em hospitais tem sorologia positiva para HCV.  O CDC, órgão norte-americano responsável pelo controle de doenças infecto-contagiosas, já notificou 54 casos confirmados de contágio ocupacional pelo HIV. Outros 134 profissionais HIV positivos provavelmente se contaminaram em um acidente, mas, como não notificaram o acidente, não foram colocados dentro dessa estatística. 

Como é possível notificar um acidente? 

A notificação da exposição a materiais possivelmente contaminados garante qualquer proteção legal à pessoa exposta, tornando o serviço onde ocorreu a exposição responsável por qualquer prejuízo à saúde da pessoa caso venha a ser confirmada uma infecção. 

No Hospital São Paulo, é a Comissão de Infecção Hospitalar (CIH) que faz as notificações (ver endereço e telefone logo abaixo). A pessoa exposta pode notificar pessoalmente um acidente no CIH durante os dias úteis no horário comercial ou através de telemensagem (ver telefone e código logo em seguida) que funciona 24 horas por dia, todos os dias. 

Endereço da Comissão de Infecção Hospitalar: Rua Napoleão de Barros, 690, 2° andar, Vila Clementino, São Paulo. 

Telefone para contato: (11) 55764463 
Telemensagem para notificação: 31784545 – código 185080 

O que devo fazer para confirmar uma notificação? 

Quando a notificação é feita no próprio CIH, imediatamente é feita a coleta de sangue do acidentado e do paciente-fonte transmissora e então o resultado das sorologias para HBV, HCV e HIV estará pronto em 48 horas. Em período noturno ou durante os finais de semana, 3 ml de sangue devem ser colhidos de ambas as pessoas quando possível e guardadas em refrigerador até serem entregues a CIH. 

Então, através da notificação, muitas pessoas acabam sabendo sem a autorização do acidentado a respeito de seu acidente e de sua possível infecção!? 

Não!!! 
No momento da notificação somente uma enfermeira experiente do CIH conversará com quem sofreu o acidente. A partir daí, você receberá um código confidencial para realização de sorologias e acompanhamento. Qualquer resultado sorológico é impresso pelo código, mantendo a sua privacidade. 

Quais são as estatísticas de notificação de acidentes com objetos pérfuro-cortantes contaminados no Hospital São Paulo? 

De 1992 até outubro de 2000, haviam sido notificados 1914 acidentes desta espécie pelo CIH. Nenhum caso de HIV transmitido de maneira ocupacional havia sido confirmado até então. Um caso de transmissão de hepatite B e outro de hepatite C estavam para ser confirmados.  Pesquisas do CIH comprovam que é grande o número de acidentes sub-notificados entre os profissionais da saúde no Hospital São Paulo. O maior número de acidentes ocorre entre os cirurgiões, auxiliares de enfermagem e pessoas pouco experientes, como alunos e residentes, por exemplo. 

Existe tratamento pós-exposição que reduza o risco de transmissão?

A prevenção ainda é a única maneira de reduzir o risco de transmissão do vírus da hepatite C. Imunoglobulinas contra o HCV não são eficazes. Caso a pessoa exposta não esteja imune ao vírus da hepatite B, ela pode ser vacinada ou revacinada a partir do momento imediatamente após o acidente, o que reduz o risco de infecção, se ela responder a vacina. No entanto, o tratamento com imunoglobulina contra o HBV até 72 horas após a exposição praticamente elimina o risco de infecção. Porém, esse tratamento só é realizado após a confirmação sorológica da fonte expositora, cujo resultado fica pronto em 48 horas. 

O tratamento quimioprofilático contra infecção pelo HIV reduz em 82% o risco de transmissão após um acidente com material contaminado com o vírus. Ele também é realizado quando não se pode confirmar a sorologia da fonte expositora. Este tratamento deve ser iniciado dentro de 48 horas após o acidente e mantido por 28 dias. 

O atraso de até 2 semanas no início da terapêutica, ainda que não seja eficaz em reduzir o risco de transmissão, contribui para amenizar os sintomas agudos da infecção e retardar a evolução para AIDS. O esquema utilizado pelo Hospital São Paulo, atualmente, com a utilização de 3 medicamentos (AZT, lamivudina e indinavir) é o mais eficaz na profilaxia pós-exposição para a infecção pelo HIV. 

E se alguns efeitos das medicações forem prejudiciais à saúde? 

Todas a drogas anti-retrovirais podem levar a efeitos colaterais como náuseas, vômitos, diarréia, fraqueza e cefaléia. Vale lembrar que o indinavir não deve ser usado em combinação com anti-histamínicos. 
Apesar disso, não se deve interromper arbitrariamente o esquema profilático. O melhor é comunicar o problema ao serviço responsável pelo acompanhamento, que poderá ter outras soluções para cada situação. 
Os esquemas profiláticos para hepatite B e HIV podem ser utilizados durante a gravidez, sendo a monoterapia com AZT mais segura nesse caso. 

Como é feito o acompanhamento após a notificação do acidente? 

A Comissão de Infecção Hospitalar, também, é responsável por esse acompanhamento. Geralmente ela colhe as sorologias em 3 momentos (logo, em seguida e com 3 e 6 meses após a notificação). Só a última sorologia confirma se houve ou não infecção. No entanto, casos particulares poderão necessitar de testes confirmatórios. O acompanhamento após a confirmação da infecção também é importante. Cerca de 6 a 10 % dos infectados pelo HBV serão carregadores desse vírus, podendo transmiti-lo para outras pessoas e desenvolver hepatite crônica ativa, cirrose e câncer de fígado.  Hepatite crônica também ocorre em 80% dos infectados pelo vírus da hepatite C.

Onde outras perguntas sobre o assunto podem ser respondidas? 

Em caso de dúvidas a respeito de prevenção de acidentes com materiais contaminados em ambiente hospitalar e quimioprofilaxia pós-exposição : 

www.aids.gov.br/assistência/manual_exposição/ocupa.htm  

www.alertamédico.matrix.com.br/mat/bioagents.htm   
www.cdc.gov.htm  
www.ad.ic.ac.uk/occ_health/blood.htm 

Respostas a questões a respeito de hepatites podem ser encontradas em:

www.labhpardini.com.br/lab/imunologia/hepatite.htm 
www.epidemias.com.br/hepatite/hepatite_b.htm 
www.hivdent.org/infctl/cdchepc.htm 

Mais informações detalhadas sobre quimioprofilaxia pós-exposição ao HIV podem ser encontradas em:

www.hivnewsline.com/issues/vol1issue4/note.html